Os votos de Luiz Fux e Cármen Lúcia devem selar decisão do Supremo depois de 9 anos de discussão
Porto Velho, Rondônia - O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que discute a fixação de critérios para diferenciar o consumidor e o traficante de maconha vai ser retomado nesta quinta-feira com o voto do ministro Dias Toffoli, que o interrompeu com um pedido de vista em março deste ano.
Mas os votos que farão a diferença para o resultado são os de Luiz Fux e Cármen Lúcia, que vão se manifestar depois dele.
Isso porque o julgamento está com 5 votos a favor e 3 contra a descriminalização do porte de maconha, e falta apenas um voto para formar maioria a favor dessa posição.
Já se sabe, porém, que Toffoli deve abrir uma terceira via no julgamento, apresentando uma espécie de voto “meio termo”, fixando um prazo para que o Executivo e o Legislativo regulamentem a quantidade de maconha que diferencia o consumidor do traficante, conforme informou O GLOBO.
Ou seja, em um aceno ao Congresso e especialmente à bancada conservadora, Toffoli quer deixar com parlamentares e o Executivo a palavra final sobre a quantidade exata para diferenciar o consumidor do traficante, ao invés de o próprio STF resolver a questão.
É por isso que o foco estará em Fux e Cármen Lúcia – nesse caso, um dos dois vai definir a maioria.
Em temas considerados da “pauta de costumes”, Fux é considerado pelos colegas um ministro mais conservador, o que levantou suspeitas de que o magistrado poderia apresentar um pedido de vista e interromper novamente a conclusão do caso, em um esforço para evitar o tensionamento das relações da Corte com o Congresso Nacional.
Fux, no entanto, já sinalizou a interlocutores que deve, sim, votar na sessão desta quinta-feira.
Nas contas feitas nos bastidores do STF, uma eventual maioria da ala progressista está nas mãos da ministra Cármen Lúcia. Em um julgamento concluído no início deste mês, por exemplo, Cármen defendeu a indenização a uma costureira transexual que sofreu discriminação em Santa Catarina, enquanto Toffoli e Fux votaram pela rejeição do recurso da vítima alegando questões processuais.
Conforme informou o blog, o resultado daquele julgamento – pela rejeição do recurso da vítima de discriminação, em pleno mês do Orgulho LGBTQIA+ – frustrou Barroso e ativistas de direitos humanos, expondo não apenas as divisões internas do tribunal, mas a própria resistência do STF em lidar com a chamada “pauta de costumes”.
O porte de maconha, no entanto, é encarado por uma ala da Corte de outra forma: como uma questão de segurança e saúde públicas, uma posição já externada pela própria Cármen Lúcia.
“Essa é uma questão de saúde, não de polícia”, afirmou a ministra em junho de 2021, ao participar por videoconferência de um evento chamado Cannabis Affair, um fórum voltado para a discussão de estudos, projetos e pesquisas sobre a maconha e sua regulamentação.
“E quem porta droga e faz uso da droga não necessariamente comete um crime que pode ser tipificado e equiparado, por exemplo, a práticas que são realmente nocivas à sociedade e às pessoas, como o tráfico”, acrescentou Cármen.
O caso analisado hoje chegou ao Supremo em 2011, quando um homem pego com 3g de maconha em sua cela na cadeia, recorreu ao tribunal para anular a condenação de prestação de dois meses de serviço comunitário, alegando que a lei em vigor ofende o princípio da intimidade e da vida privada.
O processo começou a ser julgado em 2015 e até hoje o tribunal não deu o seu veredicto sobre o tema, após sucessivos pedidos de vista que postergaram a conclusão do julgamento.
Como o Supremo deu repercussão geral ao processo, o entendimento valerá para todos os casos semelhantes – há atualmente 6 mil processos que devem ser impactados imediatamente com a decisão do STF.
O placar provisório do julgamento está 5 a 3 pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal – faltando, portanto, apenas um voto para formar maioria à corrente inaugurada pelo ministro Gilmar Mendes e acompanhada por Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Edson Fachin e a ex-presidente do STF Rosa Weber, que fez questão de antecipar o voto no caso antes de se aposentar, em agosto do ano passado.
Dados da Associação Brasileira de Jurimetria apontam que, como a lei em vigor desde 2006 no Brasil não distingue usuário de traficante, quem acaba fazendo essa definição são os próprios policiais ao registrar o boletim de ocorrência.
Segundo a associação, os policiais da capital de São Paulo costumam considerar tráfico de drogas o porte de 33g de cocaína, 17g de crack e 51,2g de maconha. No interior do Estado, os critérios são mais rigorosos: o porte de 20g de cocaína, 9g de crack e 32,1g de maconha é enquadrado como tráfico de drogas.
Ou seja: uma pessoa com 35g de maconha pode ser considerada usuária de droga na capital, ou traficante no interior de São Paulo.
Fonte: O GLOBO
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